Trágico acidente no arraial da Romaria de Nossa Senhora da Pena, em 1953
Peregrinação a Nossa Senhora da Pena (c. 1900) |
Na madrugada do dia 14 de setembro de 1953 - já poucos se recordarão -, aconteceu um trágico acidente, quase no final do arraial da Romaria de Nossa Senhora da Pena,
em Alvites, freguesia de Mouçós.
O jornal “ A Voz de Trás-os-Montes”, na
sua edição do dia 19 de setembro, faz referência à “terrível explosão do fogo
de artifício, ocorrida na madrugada de 14
de Setembro, em Alvites, freguesia
de Mouçós, a sete quilómetros
desta cidade, no final da romaria
anual de Nossa Senhora da Pena.
Esta ė uma das
mais populares do Norte e pode dizer-se que Vila Real se despovoa, pela tarde,
para ver
desfilar a procissão com seus inúmeros anjinhos e com interessantíssimos andores, altos como torres.
Muita gente
fica depois a
saborear esplêndidos farnéis, na expectativa das sessões de fogo de artifício que terão lugar pela noite dentro.
Desta vez assim
sucedeu.
O arraial estava movimentado e a noite quente
convidava a mais umas horas de espairecimento
Até que chegou
a primeira partida de fogo, que os forasteiros foram seguindo com
visível interesse. Mas quase no final, foi a tragédia:
Trinta dúzias
de fogo,
arrumadas na Casa da Comissão Fabriqueira, de súbito
inflamadas por um foguete que regressou, sem ter explodido, eclodiram como se um trovão medonho
estalasse ali mesmo. Com elas, a Casa foi pelos ares!...
Oito mortos,
vinte e tantos feridos, com maior ou menor gravidade - eis o balanço horrível
da catástrofe que de uma só família,
a do chapeleiro sr. Aníbal Ferreira,
levou o casal, um filho de 4 anos
e uma filha professora, D. Nair de jesus Ferreira.
Toda a cidade,
podemos dizer toda a região vestiu de crepes por tamanha calamidade – o funeral
dos oito mortos reuniu uma multidão imensa e consternada.
Antes, pelas 11
horas, estando presentes o Prelado da Diocese, sr. D. António Valente da
Fonseca, e todas as autoridades locais, a Câmara Municipal mandou celebrar uma
missa de corpo presente, na Capela Privativa do Hospital”.
A seguir, o mesmo
semanário apresenta uma lista com o nome dos mortos e dos falecidos:
“MORTOS - Aníbal
Ferreira, D. Aurora Glória Ferreira, Jorge Aníbal Ferreira, D.
Nair de Jesus Ferreira - todos da mesma família; Manuel António Alves Faceira, José
António da Silva, Manuel do Poço Duro e Manuel Pinto.
FERIDOS - Zulmira
de Jesus Morgado, Maria da Conceição Teixeira, Manuel Joaquim, Abel Augusto,
Clotilde
Correia, Glória de Jesus Gonçalves, Mariette Glória
Duro Ferreira, Palmira Vilela, António
Pinto Melro, Maria Cezaltina Duarte Botelho, Francisco António Rosa, Álvaro
Vilela, Raúl Assunção Lopes, Serafim Fontes Letra (professor), Laura de Jesus Matos,
Alberto Pinto, Manuel Martins Rolo, António Rego, José Manuel Bento Matos, José Paulino, etc.”
Peregrinação a Nossa Senhora da Pena (c. 1900) |
Em sequência deste trágico acontecimento, a Câmara Municipal
de Vila Real fez registar na ata da sua reunião, realizada no dia 15 de
setembro de 1953, o seguinte:
"Pelo Ex.mo Presidente foi em seguida dito
que a Câmara Municipal, como legítima representante que é de todos os
habitantes do concelho, não pode ficar indiferente perante a trágica ocorrência
que, na madrugada de catorze do corrente, na romaria da Senhora da Pena, tirou
a vida já a oito pessoas e produziu algumas dezenas de feridos, entre os quais
alguns de muita gravidade, enchendo assim de luto profundo e bem sentido pesar
toda a população como exuberantemente ficou demonstrado por ocasião dos
funerais realizados hoje e para os quais o Presidente do Município, julgando
interpretar o sentimento de todos os Senhores Vereadores, fez convite a todas
as Ex.mas autoridades e povo. Desde modo propõe: 1º - Exarar na acta um voto de
profundo pesar pelo triste acontecimento que tanto emocionou não só todos os
Vilarealenses como mesmo o país inteiro; 2º - Agradecer a todas as pessoas,
organismos e colectividades que à Câmara Municipal, na pessoa do seu
Presidente, dirigiam as suas condolências, e agradecer igualmente a todos
quantos quiseram, a convite do mesmo Presidente, associar-se à grandiosa
manifestação de pesar que na verdade foi o funeral das vítimas. Estas propostas
foram aprovadas por unanimidade." (1)
Para ler: Nossa Senhora da Pena e o milagre descrito em 1752
Também o semanário “Defesa de Espinho”, na sua
edição de 20 de setembro, publicou um texto sobre o acontecido, do qual
retiramos este dois extratos:
“A pavorosa tragédia que enlutou Vila Real na
passada 2ª feira como não podia deixar de ser, causou em Espinho uma enorme
sensação de pesar. Os espinhenses, na sua maioria, estiveram de alma e coração
com o nobre povo transmontano, e sentiram comovidamente a grande dor que
afligiu a alma da gente da grande cidade amiga. (…)”
“A nossa Câmara Municipal, interpretando o
sentir do nosso povo, e o de todas as forças vivas de Espinho, testemunhou em
expressivo telegrama à Câmara de Vila Real o seu profundo sentimento, e esse
telegrama oficial fica sendo um documento de ternura que nos honra a todos,
pois de qualquer modo representou para os vilarealenses uma piedosa gota de
bálsamo na fatalidade que os enlutou.”
A Câmara
Municipal de Vila Real, na sua reunião realizada no dia 22 de setembro de 1953,
deliberou, por unanimidade: "1º
tomar conhecimento das referências ao trágico desastre ocorrido no arraial da
Senhora da Pena, feitas pelo semanário "Defesa de Espinho, de 20 do
corrente, e agradecer ao Ex.mo Director do mesmo semanário e ao seu ilustre
colaborador João da Beira Braz os termos de verdadeira amizade em que o fizeram."
(1)
Passados 71
anos, aqui deixamos a nossa homenagem a todos os falecidos e feridos!
Nota: As imagens são meramente ilustrativas e nada têm a ver com o acontecimento, embora se refiram à Peregrinação a Nossa Senhora da Pena. (Revista Tellus – nº 30 – junho 1999 – “Vila Real em 1899)
(1) CT: AMVR\ALL-CMVR\B\A\001\Lv0091 | Arquivo Municipal de Vila Real
Sugestões:
Nossa Senhora da Pena e o milagre descrito em 1752