O “Cara-de-reco” e os “Carinhas-de-leitão”

O “Cara-de-reco” e os “Carinhas-de-leitão”

Se bem me lembro…

Alguns anos atrás, necessitei de comprar material escolar na Papelaria Eduardo, da qual é proprietário o Sr. Eduardo Lopes da Silva, muito considerado em Vila Real pelo seu dinamismo, bairrismo e inigualável popularidade.

O Sr. Eduardo é também muito conhecido por “Cara-de-reco”, alcunha que lhe ficou por ter o costume de tratar toda a gente da sua confiança por esse epíteto, isto é, virou-se o feitiço contra o feiticeiro.

Logo que entrei na Papelaria, o Sr. Eduardo, olhando para o meu filho Paulo, que me acompanhava, perguntou-lhe com ar trocista:

- Então, andas a passear meu “cara-de-leitão”?

O Paulo, que nessa altura devia ter os seus 4 anos, sem se desconcertar, perguntou-lhe:

- Avez-vos “cara-de-reco”?

- Já agora podiam ter-te ensinado tudo, meu “cara-de-leitão”, - comentou o Sr. Eduardo, julgando que o miúdo não estava bem amestrado.

Mas o Paulo, que percebeu o que ele queria dizer, respondeu-lhe pausadamente:

- Avez-vos visage de couchon?

E o Sr. Eduardo ficou todo ancho, a rir-se do francesismo do miúdo.

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Foto da Rua Dr. Roque da Silveira (Rua Direita) onde se localiza a Papelaria Eduardo

A todos os miúdos e miúdas que vão fazer as compras de material escolar à sua papelaria, o Sr. Eduardo costuma chamar-lhes “cara-de-leitão”.

Mas um dia, um dos miúdos que vinha da escola primária, com a sacola debaixo do braço, passou em frente à Papelaria e não entrou.

O Sr. Eduardo, estranhando por o pequeno ter seguido sem lhe vir à porta chamar “cara-de-reco”, resolveu provoca-lo:

- Ó Chilão, meu “cara-de-reco”, hoje não me ligas?

O pequeno estudante, sentindo-se atingido, voltou atrás e, parando à porta da papelaria, gritou lá para dentro:

- Ó cara de salpicão.

E desatou a correr pela Rua Direita fora antes que o Eduardo viesse atrás dele, com uma régua na mão, para lhe dar… o salpicão.

Claro o Sr. Eduardo não levou a mal a inesperada saída do miúdo, e até se riu bastante da sua “criatividade”.

E, na verdade, não há nenhum miúdo nesta cidade que não conheça e não goste do “Cara-de-reco”.

Histórias sobre figuras de Vila Real de Trás-os-Montes (época de 1923 a 1975)

Por Lourenço Camilo Costa

Textos publicados com autorização da família

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