Capela de S. Brás | Arte dos frescos em Vila Real

Frescos na Capela de São Brás - Vila Real

Fig 1


A Capela de S. Brás encontra-se adossada à Igreja de S. Dinis, no cemitério de S. Dinis de Vila Real.

Foi provavelmente construída na viragem do século XIV para o século XV e apresenta-nos características do estilo românico e do estilo gótico.

A forma da sua construção, um simples paralelepípedo com poucas aberturas ao exterior, debruado superiormente por uma cachorrada que suporta a cornija, apresenta-se como característica das pequenas capelas românicas do Nordeste.

Interiormente acolhe dois arcossólios, que encerram os túmulos de José Teixeira de Macedo, combatente nas praças portuguesas de Marrocos e de Lourenço Viegas, o Espadeiro, companheiro do primeiro Rei de Portugal.

O primeiro apresenta o recorte escultórico que define o gótico final português a que hoje damos o nome de Manuelino.

O segundo, que só a tradição nos aponta como última morada do Espadeiro, encerra uma arca dum gótico mais modesto.

A parede fronteira encontra-se inteiramente recoberta por um fresco hoje em estado precário de conservação que, desdobrando-se por trás do altar-mor, exercia as funções de retábulo.

A pintura a fresco utilizada na decoração parietal de vários templos do Norte de Portugal e hoje encarada como parte integrante da sua conceção arquitetural.

De facto, o fresco prolonga lhes ilusoriamente o exíguo espaço interior, utilizando-se algumas vezes, como é o caso de capela de S. Brás, a técnica do "trompe l'oeil".

Para a execução de uma pintura a fresco, o artista e o seus ajudantes começavam por montar a estrutura de andaimes necessária à execução dos trabalhos nas paredes de antemão selecionadas,

Em seguida determinavam a área a recobrir de pintura durante um dia de trabalho, uma vez que a sua execução deveria estar terminada antes de se extinguir a luz natural porque a argamassa que lhe servia de suporte secaria dentro de um limitado período de horas.

A área a trabalhar era seguidamente coberta por uma camada de argamassa grosseira, "arricio" e geralmente recoberta por outra camada de argamassa mais leve, contendo areia fina ou pó de mármore, "intonaco".

Sobre esta inscrevia-se um esboço rápido da composição por meio de traços a carvão ou a tinta vermelha acastanhada, "sinopia".

Rapidamente se passava a pintura que deveria estar concluída no final do dia antes que a luz faltasse ou que a argamassa secasse.

Uma reação química, a carbonatação, produzia a fixação dos pigmentos na superfície tratada.

As tintas previamente preparadas pelos ajudantes eram compostas por pigmentos formados por minerais em pó diluídos em água. Era mais prático e mais barato utilizar minerais da própria região.

A gama de cores utilizada vai do amarelo ocre até ao vermelho da hematite, mas também inclui pigmentos cinzento-azulados e verdes.

Os tons esbranquiçados, utilizados nas carnações e nas dobras do vestuário eram obtidos com pinceladas de cal branca.

Os sombreados, as linhas escuras dos contornos e as cores escuras podiam ser adicionadas posteriormente a seco.

Em resumo, a pintura a fresco apresenta a vantagem sobre a pintura a seco de permitir uma variação de cambiantes mais subtil e tons mais luminosos.

A transparência por seu lado só pode ser obtida pela pintura a óleo, aplicada em tábuas ou telas.

O inconveniente da pintura a fresco é ter de ser aplicada rapidamente, sem preocupações de pormenor.

No caso presente, o fresco que ocupa a parede fronteira representa três santos em nichos emoldurados por arcos renascentistas.

Frescos na Capela de São Brás - Vila Real

Fig. 2


No lugar central encontra-se o patrono da capela, S. Brás (fig. 1 e 2), cuja figura repete nas suas linhas gerais a representação do mesmo santo que se encontra na parede lateral esquerda da nave da Igreja de Vila Marim, embora numa versão mais elaborada e provavelmente posterior.

A direita encontra-se S. Paulo, identificado pelos seus atributos: o livro que representa a sua ação evangelizadora e a espada com que foi executado (fig. 3).

A figura da esquerda encontra-se já irreconhecível.

O desenho dos nichos denota um bom conhecimento da perspetiva, pretendendo dar a ilusão de estes se encontrarem inseridos na parede.

O arco renascentista que limita o nicho central apresenta nos cantos superiores dois querubins.

O bom uso das regras da perspetiva, o tratamento plástico dos corpos, dos panejamentos e das faces revelam um artista de formação erudita semelhante à dos autores dos frescos de Vila Marim e de Midões executados na segunda metade do século XVI.

Se compararmos este trio de santos com outro trio representado sobre o altar-mor de Vila Marim (S. Bento, S. Marinha e S. Bernardo) podemos observar as semelhanças mas também as diferenças entre ambas as composições.

Ambos os frescos pretendem substituir de maneira económica os retábulos de painéis que se colocavam sobre os altares, como que presidindo aos ofícios religiosos.

Em Vila Marim, os santos apresentam-se numa atitude hierática, desenhados a traços nítidos, tal como nas iluminuras medievais ou nos vitrais.

Não há preocupação de os representar em volume por meio do claro-escuro.

O sombreado é muito leve e dá-se mais ênfase às superfícies de cor quase homogéneas.

Os três santos, em posição frontal virados para o observador não sugerem quaisquer relações entre si.

São figuras independentes como se estivessem encerradas em diferentes molduras dos painéis dum retábulo.

Frescos na Capela de São Brás - Vila Real

Fig. 3


No fresco da capela de S. Brás a figura da direita está levemente voltada, e como que dirigindo-se à figura central (fig. 3).

A figura da esquerda, devido ao mau estado em que se encontra só permite distinguir a fimbria inferior da túnica, os pés e um pouco da manga do braço esquerdo. Mas essa manga dá-nos uma leve indicação de que a figura deveria estar voltada para S. Brás.

Há portanto uma relação entre os três santos, podendo-se imaginá-los em diálogo.

Esta posição de figuras foi iniciada na pintura de retábulos na Itália do Proto-Renascimento em meados do século XV, e é conhecida por "Sacra Conversazione".

Os santos apresentam-se como colocados numa cena teatral, admitindo como espectadores respeitosos os fiéis que participam nos ofícios religiosos. (1)

Interior da Capela de São Brás - Vila Real

À direita o túmulo de João Teixeira de Macedo

Capela de São Brás

É sede do vínculo dos morgados de S. Brás.

Dentro, vê-se o túmulo de Teixeira Macedo, que está classificado monumento nacional, como a capela o é também.

Esta capela, fundada ao tempo da igreja de S. Dinis e a esta encostada, destinava-se para jazigo da família dos Morgados de S. Brás.

Na referida capela, há uma pedra de armas, encimando uma sepultura com uma inscrição dedicada a João Teixeira de Macedo.

Na cidade, esse brasão encontra-se repetido em diversas casas, que os morgados possuíam. (2)

Texto da inscrição

“Aqui jaz João Teixeira de Macedo do Conselho del rei, o qual entre outros muito assinalados serviços que fez, tomou Vilvestre por combate e o susteve três anos, estando muito tempo cercado, pelejando muitas vezes, ganhando muita honra, digno de grande memória. Faleceu aos 6 dias de Julho de 1506 anos."

Sepultura rasa

No chão da capela, está uma sepultura rasa com uma argola de bronze na superfície. Na pedra
tumular estão gravadas as mesmas armas que se encontram na sepultura maior.

O letreiro diz: “sepultura de Ascânio Teixeira de Azevedo e de sua mulher D. Guiomar e herdeiros". (…)

Sepultura de Lourenço Viegas, o Espadeiro.

Segundo a tradição, nesta capela está sepultado o cavaleiro Lourenço Viegas, filho de D. Egas
Moniz
e de D. Teresa Afonso.

Companheiro de armas de D. Afonso Henriques, lutou a seu lado na batalha de Ourique. A sua heroicidade valeu-lhe o epíteto de “O Espadeiro”.

Faleceu em 1160, na fronteira de Évora, numa das muitas batalhas em que foi protagonista.

O seu corpo foi trasladado para Vila Real e o sepultaram na terra que lhe foi berço. (3)

Fontes: (1) “A Arte dos Frescos em Vila Real”, Eugénio Carvalheiro | (2) “Concelho de Vila Real”, Bandeira de Tóro – 1943 | (3) “Monografia do Concelho de Vila Real”, Júlio António Borges

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