Do Campo do Tabulado à Avenida Carvalho Araújo
O terreiro mais
conhecido e típico da cidade de Vila Real, até ao princípio do século
passado, chamava-se Campo do Tabolado.
Lugar de
passagem obrigatória, além de Passeio Público (único até finais do
século XVIII, altura em que se começa a planear o Jardim da Carreira por
reunir melhores condições de salubridade), era também onde se realizavam a feira
grande de Santo António e os festejos nos dias das procissões. Ali, corriam cavalos e touros nas ocasiões das
festas.
Este terreiro nobre,
como ainda hoje continua a ser, passou, a partir de 1867, a chamar-se Largo
do Tabolado, sendo então criado, frente ao Palácio dos Silveiras, o Largo do Conde de Amarante.
Com a expansão
que a povoação sofreu para norte, fora dos muros e em sítio plano, aqui se fixaram
os diferentes estabelecimentos da administração civil, edifícios religiosos e,
mais tarde, os da administração militar - o Regimento de Caçadores 3, o Convento
de São Domingos e o Quartel-General da 6ª Divisão Militar, em 1902,
no edifício que foi de Diogo Luís de Aguiar, na Praça Luís de Camões,
onde atualmente se encontra o Palácio da Justiça.
No final do
primeiro quartel do século passado, o Tabolado começou a sofrer certas transformações
que alteraram a sua fisionomia.
Demoliram-se
alguns blocos de um casario arcaico que cercava o velho largo, para ser aberta uma
artéria mais ampla, a atual Avenida Carvalho Araújo, com 350 metros de comprimento
e 30 de largura e dividida em duas secções de nivelamento (uma plana e outra
inclinada).
Esta nova artéria,
vista do lado sul, tem como pano de fundo o edifício do tribunal.
Do lado norte,
admira-se, ao longe, no enfiamento do vale do Corgo e em dias de céu
azul, a cidade de Lamego.
O edifício, de
arquitetura portuguesa, que serve de remate meridional da avenida é o da Câmara Municipal de Vila Real, construído no início do século passado [séc. XIX (*)] , e que se destinava então a servir de Hospital da Divina Providência.
A entrada do
imóvel lembra um típico solar português, com uma escadaria exterior, bifurcada,
de granito, ladeada de balaústres e adornada com ânforas da mesma pedra.
Esta escadaria
não foi ali construída de origem. Veio do antigo Convento de São Francisco.
Ao princípio,
entrava-se para o edifício pelo lado sul, no Largo dos Freitas, e não
pela Avenida Carvalho Araújo, como actualmente.
No quarteirão
seguinte, está o Hotel Tocaio [agora está uma unidade hospitalar],
fundado no princípio do século passado por Inácio Ferreira Tocaio. Ganhou fama
pela culinária genuinamente transmontana.
Quase em frente
do hotel, existiu em tempos um chafariz sustentado por um pilar de uma só pedra
com as armas reais gravadas.
Mais tarde, o
chafariz acabou por ser transferido para o Largo Luís de Camões,
encontrando-se colocado em frente do Palácio da Justiça [em 2021 voltou para
o lugar original].
MS
(*) A construção do Hospital da Divina Misericórdia teve início em 1816-1817 e começou a funcionar em 1823. Um dos seus mentores e beneméritos foi o general Francisco da Silveira, que morreu em 1821. Em 5 de Novembro 1914, a Câmara, por iniciativa do dr. Augusto Rua, comprou o Hospital da Divina Providência, onde, em 30 de Setembro de 1915, se realizou a primeira reunião da Câmara Municipal. (Esclarecimentos do Dr. Joaquim Aires Ribeiro)
*****
O Jardim da Avenida Carvalho Araújo é [era!] o espaço de lazer, por excelência,
no centro da cidade.
Fica enquadrado
por alguns dos principais edifícios de Vila Real - a Câmara Municipal, a
Sé e o Palácio da Justiça.
Mas a
fisionomia e a função deste espaço não foram sempre estas.
No século
XVIII, Vila Real dispunha de duas feiras semanais, à terça e à sexta-feira, que
tinham lugar no terreno do Campo do Tabolado.
Encostado à
parede do Convento de São Domingos, era colocada uma espécie de toldo para proteger as mercadorias no tempo das chuvas.
Estas feiras,
que funcionavam como autênticos mercados, abasteciam os habitantes de cereais, frutas, sal, peixe, linhos, panos, assim como lenha em molhos e carvão
aos sacos, dispondo estes combustíveis naturais de um cais próprio, onde se
fazia a sua venda diária.
*****
O Convento
de Santa Clara, em tempos, foi um dos grandiosos edifícios que «enfeitaram»
o Largo do Tabolado.
Pertenceu à Ordem
das Clarissas e, segundo a inscrição que se encontrava gravada no interior
da sua igreja, o mosteiro foi fundado e edificado em 1603 pelo cónego padre
Jerónimo Rodrigues.
Passados seis
anos, depois de examinado pelas autoridades locais, o edifício passou a estar
apto a receber as primeiras 50 religiosas.
O Convento de
Santa Clara localizava-se no cimo do Campo do Tabolado, na Rua do
Carvalho.
Tornou-se
célebre pelos finos pastéis que ali faziam as freiras, chamados «viuvinhas».
Em 1855, quando
se encontrava habitado por uma só religiosa, o convento passou para o Estado.
Por fim, em
1926, o mosteiro foi demolido para a construção do Paço Episcopal da diocese
de
Vila Real e do Seminário de Santa Clara.
Trata-se dum edifício erguido em 1930 (**) propositadamente para preparar os futuros párocos para a sua missão eclesiástica.
In ”Portugal – Memória das Cidades” (texto editado)
(**) Nem nesta data estava concluído. A última fase foi da responsabilidade de D. António Valente da Fonseca e foi concluída em 1953. O primeiro ano letivo foi o de 1930/1931, com 21 alunos. (Esclarecimentos do Dr. Joaquim Aires Ribeiro)
Saber mais sobre o Convento de Santa Clara.