Em memória dos soqueiros e tamanqueiros da nossa terra!

Soqueiro de Varge

(Mouçós - Vila Real)

Em 1878, no distrito de Vila Real, com uma população de 224.628 habitantes, havia 42 fabricantes e vendedores de tamancos.

Passados 12 anos (1890), com uma população de 237.302, já havia no distrito 108 vendedores de tamancos.

“A Rellação de Villa Real e seo termo, escrita em 1721, fruto da ordem régia que mandava as Câmaras compilar informação sobre o seu território e enviá-la para a capital, servindo aos trabalhos da Academia Real da Historia, é inequívoca quanto à relação deste calçado com rasto de pau e das roupas de burel com as gentes da montanha, de comportamento rústico.

Passemos a alguns exemplos: em Torre do Pinhão (Sabrosa) «os naturais sam rústicos, duros, e ferranhos, grandes trabalhadores da terra, calção de pao e vestem pano grosso da terra, e uzam por capas de uns gabões de burel»;

os de S. Tomé do Castelo (Vila Real) «vestem pano grosso das lans de seus gados, e em lugar de capotes uzam de uns chamados gaboens... e calção pao com meyas do mesmo borel»;

na freguesia de Borbela (Vila Real) a caracterização do calçado é mais completa «vestem de pano grosso da terra, calção de pao a que chamão tamancos, com suas correas liadas nas pernas como gente montanheza».

Base de pau, presa por correias ao pé e perna, a possibilidade de manter os pés quentes por os revestir de tecido grosso e só depois isolar do chão com a madeira apontam para o modelo de tamanco referido em Bluteau e para o tamanco de frade, não para o tipo coberto que se vulgarizará mais tarde.

Os próprios autores da Rellação significavam com o uso da expressão calçar de pau a profunda incivilidade, com o seu quê de pureza e genuinidade arcádica.

Quando a situação económica do camponês melhora e passa a socializar com gente fidalga e urbana, ou ao apresentar-se fora da terra, logo prefere trajar segundo a moda, embora para trabalhar no campo mantenha os tamancos: os da Campeã (Vila Real) «sam todos lavradores fartos, rústicos e grosseiros ... porem, vestem seragoças, e uzam capa, polaina e çapatos, e no seu distrito calção tamancos», procedendo da mesma forma, por exemplo, os de Vila Cova (Vila Real).

Alvações do Corgo (Santa Marta de Penaguião), já na área produtora do vinho fino e com muito trato de almocrevaria, tem camponeses com modos cortesãos, «todos vestem panos de logea de mercador e uzam de meyas e sapatos» (41).

(41) SOUSA, Fernando de; GONÇALVES, Silva - Memórias de Vila Real. Vila Real: Arquivo Distrital e Câmara Municipal de Vila Real, 1987, p. 474, 484, 559, 531, 544 e 401 respectivamente.”




in "Soqueiros e tamanqueiros - Fabrico e usos do calçado de pau em Cabeceiras de Basto", Teresa Soeiro (UPorto/FLUP - CITCEM) (texto editado)


Soqueiro

Quadro do Museu Etnográfico da Província de Trás-os-Montes e Alto Douro
(Edição da CMVR - 1998)

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