O senhorio de Vila Real – O trágico fim do seu último marquês

Palácio dos Marqueses de Vila Real - Monumento Nacional

«Até ao reinado de D. Fernando, andou Vila Real na propriedade da coroa; este monarca, porém, deu-a a D. Leonor Teles de Menezes, sua mulher, que, depois da morte daquele e conspirando contra a autonomia da pátria, cobriu de vergonha o País.

Levada pela ambição que a dominava, chamou seu genro, D. João I de Castela, a quem mandou aclamar nas terras de que era donatária.

Mas, debulhada ela, em breve, de suas opulências e recolhida à força no mosteiro de Torresilhas, passou Vila Real para João Rodrigues Porto Carreiro, senhor da Vila de Anciães.

Mau patriota também, ligou-se este fidalgo ao partido castelhano, sendo derrotado por Vasco Rodrigues de S. Payo.

O vencedor recebeu de D. João I de Portugal os bens do renegado, a excepção de Vila Real, ao tempo em poder de uma filha de Porto Carreiro, casada com um sobrinho de Leonor Teles.

Resgatou este, quanto possível, as faltas da família, porque combateu sempre sob a bandeira portuguesa, e com valor e lealdade se houve, pelo que foi agraciado com o título de conde de Viana.

Nesta família se conservou então o senhorio de Vila Real.



O sétimo senhor, D. Pedro de Menezes, segundo conde de Viana e primeiro marquês de Vila
Real
, ficou célebre na história pelo arrojo de suas acções em Ceuta, contra os sarracenos.

O último membro desta família que possuiu Vila Real, foi D. Miguel de Noronha e Menezes, décimo-sexto proprietário.

Este e seu pai, D. Luiz de Menezes, foram vítimas da conspiração contra D. João IV, e com eles acabou a nobre e prestigiosa casa dos marqueses de Vila Real.

Relembremos a trágica aventura:

Depois de aclamado D. João IV, muitos fidalgos e homens poderosos houve, que julgaram impossível a sua conservação no trono.

O Pais estava exausto de recursos, e D. Filipe IV de Castela havia espalhado punhados de desmoralizações, à custa de benefícios ou simples promessas.

Não faltaram caracteres dúcteis para o mercado da vilanagem, e, por outro lado, havia ainda os timoratos receosos da vindicta real, caso D. Filipe chegasse a dominar a revolução.

Daqui resultou a formação de partidos e de conspirações.

Salientava-se entre os descontentes o arcebispo de Braga, D. Sebastião de Matos e Noronha, adversário da Restauração. Foi ele o cabeça da conspiração.



Soube mover a vontade de vários senhores, entre eles

- seu sobrinho, conde de Armamar,

- António de Mendonça, comissário da Bula,

- D. Frei Luiz de Melo, bispo eleito de Malaca,

- António Correia, oficial-maior da secretaria do Estado,

- Manuel Valente, escrivão de Távola de Setúbal,

- D. Francisco de Faria, bispo de Martyria,

- Sebastião de Carvalho, desembargador da Suplicação,

- Paulo de Carvalho, vereador da câmara de Lisboa,

- D. António de Atayde, conde da Castanheira,

- D. Francisco de Castro, inquisidor geral,

- Pedro Baeças, tesoureiro da Alfândega,

- o conde de Val de Reis

- e D. Diniz de Menezes, marquês de Vila Real.

O marquês, filho do último, D. Miguel de Noronha e Menezes, estava em Lisboa, recentemente casado com D. Maria de Noronha, gentil menina, e nesta cidade o procurou o velho marquês, para lhe comunicar o que se propunham os conspiradores e pedir-lhe a adesão.

Relata o imortal escritor Rebelo da Silva as diligências do pai e as escusas filho, que, enamorado da esposa, e leal, tentou dissuadir o velho marquês, sem, no entanto, o conseguir.

E razão tinha o pobre mancebo. Para mais, D. João IV estimava-o, tendo-lhe mesmo feito mercê do título de duque de Caminha; mas o que ele não podia era ser denunciante do pai, e, assim, a sua cumplicidade estava provada.

Marcaram os conjurados o dia 5 de Agosto de 1641 para a execução do plano, que era lançar fogo ao palácio real, por todos os lados, e na confusão prender D. João IV, proclamando em seguida a D. Filipe.

Mas o bispo tinha uma amásia, e esta conheceu o segredo, fazendo-o chegar ao conhecimento de el-rei, pormenorizado com os nomes dos conspiradores.

E todos foram presos: - uns negaram, outros imploraram graça.



O jovem duque de Caminha, o menos culpado de todos, limitou-se a pedir generosidade; e sua juvenil esposa banhou de lágrimas os pés da rainha. Mas tudo foi baldado. Queria o rei perdoar; a rainha, não.

Foi a galope o processo; no dia 26 do mesmo mês de Agosto, votou a Relação a morte dos dois marqueses de Vila Real e do conde de Armamar.

Em vão também, ali se ergueu ainda, solene, a voz de um dos juízes, preguntando aos outros se acaso um filho podia denunciar seu pai, e fazendo valer os melhores argumentos em favor do desgraçado duque de Caminha.

No dia 29, pai e filho foram degolados no Rossio, em Lisboa; o arcebispo de Lisboa, D. Rodrigo da Cunha, fôra também ao paço implorar pelo jovem mas a rainha, inflexível e vingativa, respondeu-lhe que o único favor que lhe podia fazer, a ele, arcebispo, era guardar o segredo de tal súplica !

E, coisa espantosa! o carrasco das pobres vitimas conservou-se sempre com a cara coberta de
modo que ninguém ficou sabendo quem ele era !

Completara o duque de Caminha vinte e sete anos, e vinte e quatro o conde de Armamar.

Aspecto de uma rua de Vila Real em 1907

(À direita, o palácio dos Marqueses de Vila Real)
("Ilustração Portuguesa", nº91 - 18 de Novembro de 1907)

D. João IV foi, neste processo, muito além das necessidades do seu reinado, não faltando por isso quem o acusasse de ter tido principalmente em vista a fortuna colossal dos marqueses de Vila Real.

Efectivamente, os bens das vítimas reverteram para a coroa, e com eles instituiu el rei a Casa do Infantado, em favor de seu filho terceiro, D. Pedro, depois segundo do nome na lista dos monarcas portugueses».

Fonte: “O Concelho de Vila Real”, Bandeira de Tóro, Julho de 1943 | Imagem: Bilhete Postal – Edição: Imprensa Moderna, 1907 – Fototipia. Fotografia: [António Lopes Martins], década de 1890. Reedição: Serviços Municipais de Cultura, Vila Real, 2003. Coleção: Adelaide Vicente.

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