O Hospital da Divina Providência - Vila Real

“Alvo de poucos estudos – destacando-se os trabalhos de Pinho Leal, Adelino Samardã, Costa Godolfim, Manuel Silva Gonçalves, Paulo Guimarães e especialmente de Manuel Couto, que seguimos de perto nesta nossa análise –, a cronologia desta Instituição [Hospital da Divina Misericórdia] é pouco consensual, pelo que fundamentámos as fases da sua evolução nas fontes encontradas no acervo documental do Arquivo Distrital de Vila Real, o que nos permitiu delimitar algumas etapas.

A primeira etapa, que corresponde à sua criação, situa-se em finais do século XVIII, em 13 de Março de 1796, com o arrendamento, pela Santa Casa da Misericórdia de Vila Real, através do seu provedor Joaquim José da Silva Barbosa e Sousa, da casa de João Guedes (“serralheiro”), na Rua de Trás da Misericórdia, para alojar um novo hospital que substituísse o Hospital do Espírito Santo – um hospício para viajantes e romeiros pobres, instalado na Capela do Espírito Santo, designada também por Capela do Hospital de São Brás (localizada numa das extremidades do Campo do Tabolado, hoje Avenida Carvalho Araújo). (1)

A denominação então escolhida – Hospital da Divina Providência –, que manteve enquanto permaneceu sob a direcção da Misericórdia de Vila Real, está diretamente relacionada com o facto de a administração da Santa Casa em 1795-1796, segundo a Crónica do Hospital, escrita por volta de 1828, nada mais ter senão “os bons desejos e confiança na Divina Providência”.

Todavia, o Hospital funcionou pouco tempo no edifício primitivo, já que, a 16 de Outubro de 1796, deu-se a transferência dos doentes para um segundo edifício, adquirido a 3 de Agosto, por 500$000 réis, pela Santa Casa da Misericórdia, a José Manuel Pinto (“de Lamego”), na Rua da Praça Velha (atual Praça Camilo Castelo Branco). (2)

O século XIX marca uma nova etapa na vida desta Instituição, com a edificação de um novo Hospital, construído de raiz para este propósito, na Praça Velha, mais precisamente no “Sítio do Cano Velho”, a sul do Campo do Tabolado, como ficara acordado em reunião da Mesa da Santa Casa da Misericórdia de Vila Real, de 19 de Janeiro de 1817.

Esta construção apenas foi possível devido a um notável reforço de meios financeiros obtido através das contribuições dos irmãos da Santa Casa, angariadas pelo provedor de então, Francisco da Silveira Pinto da Fonseca Teixeira (conde de Amarante), e procurou responder ao aumento das necessidades de assistência hospitalar, não só da população local, como dos militares em campanha e da mão-de-obra estrangeira, sobretudo galega, que se deslocava sazonalmente para a região, como evidenciam os registos de entrada e saída de doentes. (3)

A 19 de Outubro de 1823, com a conclusão das obras, efetuou-se a transferência dos doentes para o novo Hospital, e a 14 de Agosto de 1824 era benzido o seu cemitério. (4)

Por decisão da Mesa da Santa Casa da Misericórdia de Vila Real, de 10 de Agosto de 1839, foi decidido que o Hospital teria uma botica própria, o que mostra a evolução deste Estabelecimento.

O século XX marca a última etapa da vida desta Instituição, com a sua transferência para as instalações do Colégio de Nossa Senhora do Rosário (atual sede da Santa Casa da Misericórdia), em 1915.

Esta deslocação, promovida pelo dr. Augusto Rua – simultaneamente provedor da Misericórdia e presidente da Câmara Municipal de Vila Real – permitiu que o anterior edifício passasse a servir de Paços do Concelho, situação que se mantém ao presente.

Finalmente, em 1975, em sequência da revolução de 25 de Abril de 1974 e da política de nacionalizações seguida pelo Estado central, o Hospital da Divina Providência saiu definitivamente da alçada da Santa Casa da Misericórdia de Vila Real.”

Fonte 

Notas, conforme Bandeira de Tóro em “Concelho de Vila Real”, Julho de 1943:

1.- A 13 de Março de 1796 abriu-se o hospital com a admissão de um enfermo, instalando-se nos altos da casa pertencente à viúva de João Guedes, serralheiro. Os recursos da Misericórdia eram insuficientes para a sustentação de um tão alto e caridoso instituto.
2.- D. Maria Jacinta Correia Teixeira do Amaral deu 90$000 reis de esmola ao referido hospital.
Alguns meses depois em 3 de Agosto de 1796 já a piedosa instituição dispunha de 500$000 reis com que se comprou a José Manuel Pinto e mulher, em Lamego, uma casa que possuía na Rua da Praça Velha, sítio do atual estabelecimento.

Realizou essa compra Francisco da Silveira Pinto da Fonseca, nessa época ainda simples tenente de Cavalaria 6.

Da casa alugada atrás da Misericórdia foram os doentes transferidos, a 16 de Outubro de 1796, para a casa privativa do Hospital da Providência, nome com o qual pretenderam consagrar a piedosa instituição, para demonstrar a vivíssima crença dos seus fundadores no êxito duma obra que, havendo começado sem recursos alguns, prosperava tão evidentemente.

3.- Francisco da Silveira Pinto da Fonseca, em 1812, já então tenente-general, e na qualidade de Governador de Trás-os-Montes, prestou relevantes serviços ao Hospital da Providência.

Por sua intercessão, o arcebispo, D. Miguel da Madre de Deus, contribuiu com uma considerável esmola para a construção do edifício, e informou favoravelmente a petição que ao Sumo Pontífice se dirigira para a extinção do beneficio das Santas Engrácias, erecto em Canelas, e cujo rendimento, computado em 400$000 reis anuais, reverteu em favor do hospital.

Conquanto a casa do Hospital fosse comprada em 1796, a construção do novo edifício não veio a começar senão em 1817, por várias dúvidas que se levantaram sobre qual seria o local mais apropriado ao fim que se tinha em vista.

4.-  No livro de enterramentos realizados na igreja da Misericórdia encontra-se, além de outros, este termo: «Na sexta fiada, sepultura n.° 45 está enterrado um soldado, que morreu abafado de terra no alicerce do novo hospital, que se principia por ordem do Ex.mo Snr. Conde, no primeiro dia do mês de Abril de 1817, no lugar da Câmara desta vila e sítio do Cano Velho. Atraídos pelo General Silveira vieram para o hospital os benefícios e doações dos grandes benfeitores Francisco Rodrigues de Freitas e seu irmão José de Freitas, ricos cerieiros da localidade.»

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