O concelho de Vila Real em 1937, pela pena de Emílio Roque da Silveira
Vila Real - trecho da Avenida Carvalho Araújo (c.1937) |
“Uma das mais lindas cidades
portuguesas é, sem dúvida, Vila Real.
De quando data a sua fundação?
Como a antiga Panóias se encontrava
bastante arruinada, alguns dos seus habitantes pediram a D. Afonso III para lhes
dar uma nova vila. E, então este monarca, em 7 de Dezembro de 1272, deu foral
àqueles que quisessem povoar a nova vila.
Sucedeu, porém, que ela se não fez
desta vez, ignorando-se, até, por que motivo tal se deu.
Mais tarde foi pedido novo foral a D. Dinis. Este monarca veio, segundo reza tradição, ver o local que lhe
indicaram para a fundação da vila.
E, como ele lhe agradou, deu o respetivo
foral, passando a vila a chamar-se Real, por ser um rei quem a fundou.
Começou ela, então, a construir-se no local onde hoje existe o bairro da Vila Velha.
Mas, como este terreno era acanhado, não tinha movimento de passageiros, por não ser atravessado por estradas, e a única saída que possuía, era para norte, começou a desenvolver-se a vila para este lado, para fora do recinto murado e a ser abandonado o primitivo terreno, a tal ponto que D. Fernando I concedeu, com o fim de obviar a isto, aos moradores daquele sitio, a isenção do serviço militar e de todos os tributos e encargos concelhios, enquanto ali vivessem.
Contudo, nem assim
conseguiu fixá-los.
Começou, por isso, Vila Real a
expandir-se na direção norte, e de tal forma se desenvolveu, que já em 1721 contava
45 ruas e seis praças.
Mas a grandeza de Vila Real data de
1768, ocasião em que começou a praticar-se, intensivamente, nesta região, o
cultivo da vinha.
Com a vinda de vários nobres para
aqui e de altos oficiais de justiça, como ouvidores, juízes de fora e
almoxarifes, e com o grande rendimento que começou a dar o vinho tratado, construíram-se
muitas casas brasonadas, contando-se até ainda há pouco, 27.
Além destas casas brasonadas, ainda
se construíram ótimos edifícios, tais como a Casa do Arco, do Marquês de Vila
Real, o palácio do 1.º conde de Amarante, o edifício do Hospital Civil, onde atualmente
se encontram os Paços do Concelho, os conventos de S. Domingos e de S. Francisco,
as igrejas de S. Pedro e dos Clérigos, etc.
Pode afirmar-se que Vila Real foi
uma das terras do país que teve mais famílias nobres. Muitas viveram com grande
fausto, tendo 14 delas chegado a ter trens montados para passeios dentro da
vila. Na procissão do Corpo de Deus, reuniram-se, uma vez, 16 cavaleiros de
diversas ordens.
As festas que aqui se celebravam
tinham sempre um cunho de grandeza.
Em 1807, realizaram-se com toda a
pompa as cerimónias da Semana Santa, merecendo
especial menção o Descimento da Cruz.
Celebrou-se essa cerimónia no monte do Calvário, tendo entrado nela mais de 40 figuras bíblicas. A
concorrência do povo foi de muitos milhares de pessoas.
Vila Real tem progredido sempre.
Possui uma rede completa de águas e
saneamento, goza de uma bela iluminação pública,
tem lindos jardins e as suas ruas são quási
todas pavimentadas a paralelepípedos de granito.
Há em Vila Real pontos de vista
admiráveis.
É deslumbrante o panorama que se
disfruta do passeio que circunda a leste, sul e oeste, a Vila Velha.
O rio Tourinhas, que já moveu mais
de 40 rodas de moinho, precipitando-se, através
da rocha viva, numa queda de dezenas de metros,
vem lançar-se no Corgo, que caminha, la ao fundo, apertado entre as duas margens, indo mais
adiante enlaçar-se com o Cabril.
A paisagem é
das mais variadas. Ora terrenos rochosos,
talhados a pique, inteiramente escalvados, ora terrenos em socalcos com magnífica vegetação, ora lombadas de
terra que se sucedem e prolongam numa extensão a perder de vista.
De onde a onde, a nota graciosa dos
povoados a branquejar, como a darem vida e alegria numa natureza áspera e severa.
Do adro do Calvário, experimenta-se também uma sensação de beleza inédita, contemplando a variedade de aspetos que nos oferece esse cenário de sonho e de maravilha.
E no meio dele avistam-se a torre e acrotérios do mais belo
palácio da província - o Solar dos Condes de Vila Real.
E. ROQUE DA SILVEIRA
Presidente da C. A. do Município de Vila Real”
In “Portugal Económico Monumental e
Artístico" - Fascículo XX (texto editado e adaptado)