Vila Real monumental, segundo João Barreira (1937)

Palácio dos Condes de Vila Real, em Mateus

“Vila Real é uma das cidades mais alegres do norte de Portugal.

Construída num ubérrimo planalto sobranceiro ao Corgo, que aqui salta entre altivas e ásperas penedias de um aspecto dantesco, estende a sua casaria branca em vistoso contraste com o tom cinzento do granito trasmontano.

O centro da cidade é o vasto campo do Tabolado, que num dos seus lados mostra a fachada de uma velha casa quinhentista, de escada exterior cheia de pitoresco e onde se presume tenha nascido o navegador Diogo Cão, que chegou ao Zaire em 1484.

Do lado nascente ergue-se neste campo a casado Arco, antiga pertença dos Condes de Vila Real e que mostra um grupo de janelas de estilo manuelino destacando na silharia nua de granito, terminada em denticulado de ameias.

Esta construção está hoje muito restaurada, para se aplicar à vida moderna.

Ao fundo do Tabolado levanta-se a frontaria do Hospital da Misericórdia, com uma bela escadaria exterior, construção devida ao conde de Amarante em 1817.

Mas o edifício mais notável deste local é a igreja gótica de São Domingos, que fazia parte de um antigo convento dominicano.

É uma igreja de três naves com transepto, terminada por uma capela absidal, alterada no século XVII.

Posto que construída nos fins do século XIV ou começos do XV, oferece ainda reminiscências românicas na forma cúbica dos capitéis, nas garras das bases e nas proporções das colunas embebidas nos pilares.

Todavia, os capitéis ornamentados de folhagem, cachos de uvas e cabeças humanas (uma freira, um bispo lendo o Evangelho, um soldado coberto com o elmo de viseira erguida) se mantêm um caracter românico, manifestam pela sua execução realista um gótico já adiantado.

Num dos capitéis vê-se um A de forma gótica sobrepujado por um O tombado. Talvez assinatura do escultor - António.

Nas paredes laterais, há túmulos tipo arcossólio, com as inscrições muito apagadas e no adro levanta-se um cruzeiro de granito datado de 1594.

No largo do Pioledo veem-se os restos de uma capela românica que pertenceu a uma antiga albergaria.

No centro da cidade levanta-se a frontaria barroca da igreja de S. Paulo, flanqueada por duas enormes colunas e junto da qual se faz a feira dos pucarinhos, com um curioso mostruário da cerâmica local.

Mais a norte a igreja de S. Pedro, datada de 1528, e na estrada de Chaves o antigo convento de S. Francisco, hoje transformado em quartel.

Mas o convento mais notável de Vila Real era o de Santa Clara, no topo do já descrito Tabolado, hoje demolido, mas onde ainda há anos se via um mirante de angulo com suas rótulas, de onde partiam os motes para os versejadores no Terreiro, em dias de abadessado.

Havia aqui belos azulejos dos séculos XVII e XVIII.

Da esplanada do cemitério onde se encontra a igreja de S. Diniz e ponte do primitivo castelo, contempla-se um dos mais belos panoramas da província, as gargantas do Corgo e do Cabril, abruptas, cortadas de quedas de água, formando um cinto de rochas de linha grandiosa.

No cemitério, veem-se os restos de uma pequena igreja românica, muito transformada, dentro da qual se ergue um túmulo manuelino.

No topo da cidade fica o terreiro do Calvário, centro da feira anual de Santo António, onde se ergue a Capela alpendrada da invocação do taumaturgo, construção de 1535, com azulejos de 1642.


Capela do Palácio dos Condes de Vila Real, em Mateus

Mas a joia arquitetónica da região é o famoso palácio dos Condes de Vila Real, em Mateus, a 3 quilómetros a leste da cidade, no estilo Luís XV.

A fachada, de proporções monumentais e de aspecto senhoril, compõe-se de um corpo central, aos lados do qual avançam dois pavilhões laterais, entre os quais e ao fundo, se desenha a perspectiva de uma escadaria de balaustres de pedra, de sumptuosa linha heráldica.

No corpo central rasgam-se as altas janelas do frontão, rematado em concha, e por cima o remate de platibandas de balaustres, com estátuas intervaladas de pináculos, tendo no meio, mais alto, um corpo flanqueado de pilastras sob um frontão sinuoso, onde o brasão se esculpe entre sumptuoso paquife.

Perto, a torre primeva de Quintela, vestígio de um solar de rico-homem.

Ao norte de Vila Real, fica a povoação de Abambres [confusão com Ponte] onde se ergue, sobranceira à linha férrea, a igreja romano-gótica da Senhora de Guadalupe, com uma bela linha de modilhões sob a linha da cimalha e um recortado óculo na ousia.

A S.E. de Vila Real fica a aldeia de Mouçós, onde se ergueu uma igreja românica completamente modificada no século XVIII, mas onde se encontra ainda, numa capela, o túmulo de Fernão de Brito, datado de 1483, tendo o jazente na tampa e os Doze Apóstolos esculpidos em nichos ogivais, escultura rude na dureza do granito regional.

João Barreira”

In “Portugal Económico Monumental e Artístico" - Fascículo XX (texto editado e adaptado)

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